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A Inconstitucionalidade da Apreensão de Veículos pelo não pagamento do IPVA. 

As famosas "Blitz do Ipva" 

         Apreender um veículo como forma de coagir um condutor a quitar o débito do tributo, condicionado o licenciamento veicular à liberação da propriedade particular apreendida indevidamente, é Inconstitucional.

           O Estado não pode usar a apreensão do veículo como forma de forçar o contribuinte ao pagamento do IPVA, esse tem outros meios de cobrança previstos em lei para exigir o imposto atrasado. Deve ser ofertado ao proprietário do veículo discutir a cobrança do IPVA sem ser privado do seu direito de propriedade.

          A Ordem dos Advogados do Brasil, já se manifestou sobre o assunto, vejamos: “O Estado se torna infrator ao obrigar o cidadão a colocar em dia o imposto veicular (IPVA), usando forças policias de segurança para promover Blitz do IPVA, como forma de identificar e reter veículos atrasados ao pátio do DETRAN em prol dele próprio.”

          Antes de emitir qualquer juízo de valor acerca do cumprimento da obrigação tributária deve haver um processo administrativo para investigar. No processo administrativo é possível que o contribuinte tenha acesso à ampla defesa e ao contraditório.

         A atitude que o Poder Público vem tomando em relação ao tema configura lesão às garantias constitucionais fundamentais do cidadão, estando na contramão do ordenamento jurídico consagrado na Constituição Federal de 1988, uma vez que o ente público utiliza-se do tributo com efeito de confisco, o que é vedado expressamente pela nossa Carta Magna.

          A apreensão de um automóvel sem o devido processo legal, cujo proprietário não tenha feito o pagamento do imposto sobre a propriedade de veículos automotores, é um exemplo claro de excesso de poder na atuação do Estado.

          O artigo 230, inciso V, do Código de Trânsito Brasileiro traz claro esse abuso de poder e a falta do devido processo legal, nesse caso, vejamos: “Art. 230 conduzir o veículo: [...] V- que não esteja registrado e devidamente licenciado. [...] Penalidade: multa e apreensão do veículo.”

           Nas “blitz do IPVA” é isso que vem acontecendo, os carros são

apreendidos e conduzidos aos depósitos com a fundamentação nesse artigo, sem ao menos ter o contribuinte direito a uma ampla defesa e contraditório.

        É indiscutível a obrigação do contribuinte de pagar o tributo. Ademais, evidente é a ilicitude de circular com o veículo sem o CRLV. Entretanto, nenhum Estado de Direito pode utilizar da ilicitude de seus administradores como justificativa para cometer outra. Não se justifica, nem mesmo entre o Estado e os particulares, a justiça nos moldes “olho por olho, dente por dente”.

         Assim, o contribuinte que deixa de pagar o IPVA não pode, em razão disso, sofrer uma restrição de direito à propriedade na esfera administrativa sem o devido processo legal, conforme propõe o artigo 230, inciso V, do CTB.

          O Estado, como titular do direito de arrecadar, tem a obrigação de utilizar os meios jurídicos adequados para garantir a satisfação do seu crédito.

          O silêncio é anuência, já dizia o dito popular. Enquanto o contribuinte “abaixar a cabeça” e aceitar a imposição de normas como esta que afetam inúmeras garantias constitucionais que foram a duras penas conquistadas, e que dão sustentação ao Estado Democrático de Direito, no qual se constitui a República Federativa do Brasil, cada vez mais estar-se-á dando passos para trás, distanciando-se ainda mais da busca incessante daquilo que é por todos conceituado como democracia.

              Enraizado na cultura nacional, como componente necessário e essencial da vida humana na tradição romano-cristã, encontra-se o princípio do respeito à propriedade privada, como elemento imprescindível ao desenvolvimento do ser e de sua família, dentro da orientação própria e em razão da liberdade natural de que é dotado (BITTAR, 1991, p. 153-154).

            E assim também os são os princípios do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa. Garantias estas que, ao que parece, foram esquecidas pelo legislador ao elaborar o atual Código de Trânsito, no qual se privilegiou, mais uma vez, o furor arrecadatório do Poder Público.

          É preciso que o cidadão dê um basta a tudo isso. São pequenas atitudes como este simples ensaio é que darão início a um processo de profunda reformulação pelo qual precisa passar o País.                  

        Todos devem acreditar que mudar é possível. Basta querer.         

Maternidade de Substituição
 
" Barriga de Aluguel"

Saiba quais são seus direitos perante as companhias aéreas antes de viajar:

Saiba seus direitos perante as companhias aéreas antes de viajar:

Quem nunca passou por algum imprevisto ou mesmo aborrecimento em um aeroporto? Ao chegar se depara com uma triste notícia: voo atrasado ou mesmo preterição de embarque (embarque não realizado por motivo de segurança operacional, troca de aeronave, overbooking, etc). Uma dor de cabeça para qualquer viajante, pois se ele tem conexão com outro voo para chegar ao seu destino ou algum compromisso importante no ponto final da viagem, vai ter problemas, atrapalhando a sua programação. Mas nem tudo está perdido, em situações como essas, as companhias aéreas tem deveres para conosco consumidores e nesses casos fique atento a eles e caso não seja respeitado procure seus direitos com um advogado, vamos a eles: Para começarmos devemos ficar atentos à Resolução n˚ 141/2010 da Agência Nacional de Aviação Civil, a ANAC, que traz as principais regrais que as companhias aéreas devem respeitar. Guarde bem o número desse documento e as informações que seguem!

Voo Atrasado: Os passageiros possuem direito à informação sobre o voo atrasado. Isso quer dizer que as companhias aéreas devem informa-los do atraso assim que souberem do evento. Uma dica importante é solicitar tal informação por escrito, para ter um meio de prova sobre o voo atrasado, se for necessário entrar na Justiça pelos seus direitos.

Assistência Material Gratuita: Por conta de um voo atrasado, o passageiro também tem direito à assistência material gratuita, ela se destina à satisfação das necessidades imediatas do passageiro, segundo a resolução da ANAC, a assistência material começa a contar a partir do momento que houve o atraso, cancelamento ou preterição de embarque, conforme o seguinte tempo de atraso:

a) A partir de uma hora: a empresa aérea deve fornecer facilidades para que o passageiro se comunique (internet, telefone, etc.)

b) A partir de duas horas: a companhia deve arcar com os custos de alimentação do passageiro; e

c) A partir de quatro horas: hospedagem / acomodação e traslado (transporte do aeroporto ao hotel ou semelhante). Quando o passageiro estiver em seu domicílio, a companhia aérea tem a obrigação de, somente, oferecer o transporte para a residência do consumidor e desta para o aeroporto.

Temos ainda aquela situação em que o passageiro tem o direito à reacomodação em outro voo que se dá de duas formas: a) em voo da própria companhia aérea, conforme conveniência do passageiro, em data e hora de sua escolha, ou b) em voo da companhia aérea ou de outra empresa que oferte o mesmo serviço ou equivalente para o mesmo destino, na primeira oportunidade que houver.

O passageiro que não quiser ser reacomodado em outro voo tem direito, se desejar, ao reembolso integral do valor pago pelo bilhete aéreo não utilizado.

Essa assistência material deverá ser oferecida também aos passageiros que já estiverem a bordo da aeronave, em solo, no que for cabível.

Vale lembrar que as companhias aéreas tem responsabilidade objetiva, ou seja, respondem independentemente de culpa, elas são responsáveis pelas falhas na prestação de seus serviços, que podem ocasionar o atraso de voo.

Uma causa comum para que um voo atrase são as condições climáticas desfavoráveis, ainda assim, a companhia tem a responsabilidade de garantir os direitos dos passageiros.

Outro direito que surge também é o dano moral em caso de atraso de voo, o Superior Tribunal de Justiça possui jurisprudência sedimentada que determina que em determinados casos, o consumidor sofre danos morais e tem direito à indenização.

Se tiver em um voo atrasado, pleiteie pelos seus direitos, dirija-se até um balcão de atendimento da empresa e solicite as prerrogativas estabelecidas na Resolução da ANAC e se mesmo assim não resolver procure um advogado. Atente-se a juntar todas as provas possíveis, tire foto, registre, faça vídeos, exija a declaração de atraso, guarde comprovantes e bilhetes, pois em caso de descumprimento dos seus direitos a Justiça dever ser o caminho e as empresas aéreas são rés assíduas dos Tribunais e costumam perder suas causas quando o direito dos passageiros são violados, a forma mais fácil e econômica de ingressar é através do Juizado Especial Cível.

Segue link da Resolução da ANAC, sempre bom imprimir e levar junto com a viagem: 

 

http://www.anac.gov.br/assuntos/legislacao/legislacao-1/resolucoes/resolucoes-2010/resolucao-no-141-de-09-03-2010/@@display-file/arquivo_norma/A2010-0141.pdf

Dra. Daniella Campos B. de Amorim – Advogada inscrita na OAB/GO, formada pela Pontifícia Universidade Católica de Goiás, pós-graduada com especialização em Direito da Medicina pela Universidade de Coimbra – Portugal, Direito Tributário pela Estácio de Sá - Rio de Janeiro e Mestranda em Criminologia pela Universidad de Ciencias Empresariales y Sociales de Buenos Aires – Argentina, professora

 

Embriões Excedentes: O que fazer ? 

              Entende-se que, a maternidade de substituição é uma técnica de reprodução humana medicamente assistida que consiste, em linhas gerias, em implantar o óvulo da mãe genética no útero da mão doadora, para que esta possa levar a termo a gestação e, ao fim do processo entregar a criança à primeira.  

            Ocorre que apesar da crescente evolução das novas biotecnologias, destacando-se as do campo reprodutivo, não houve o acompanhamento do direito pátrio, restando aos juízes o encargo de promover respostas a essa ampla lacuna jurídica, caso a caso, de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais do direito, conforme autoriza a lei de introdução ao Código Civil Brasileiro de 2002.  

            Muitas são as dificuldades jurídicas que advêm da prática da maternidade de substituição, cita-se Guilherme Gama destacando três possibilidades mais comuns da técnica: a) Quando o material genético é do casal titular do projeto parental, com sua implantação no corpo de outra mulher; b) quando o material genético pertence só ao marido/companheiro e à mulher que gerará a criança não fazendo parte do casal e emprestando seu útero; e c) quando o casal infértil utiliza-se de material genético de doadores e de útero alheio, para gerar uma criança, com o compromisso da mulher gestante de entregar a criança ao casal patrocinador da técnica de reprodução assistida.

            No Brasil o encargo de promover respostas à varias questões da gestação por substituição encontra-se em lacuna jurídica, sendo ela amparado pela analogia, os costumes e os princípios gerais do direito. Os Tribunais tem-se baseado atualmente na Resolução número 2.013/2013 do Conselho Federal de Medicina, que pode apenas orientar o enfrentamento dos casos concretos, já que vincula apenas os médicos envolvidos na realização dos procedimentos de reprodução assistida.

         Sobre a gestação de substituição, também chamada pela resolução de “doação temporária do útero”, existe apenas o inciso VII que lista as condições que devem existir para que seja aceitável a “barriga de aluguel”: deve haver um problema médico que impeça ou contraindique a gestação na doadora genética; as doadoras temporárias do útero deverão ser da mesma família da doadora genética, em um parentesco até o quarto grau (sendo os demais casos tratados como exceção e sujeitos à autorização do CRM); a mulher receptora deve ter a até cinquenta anos de idade; e a relação não pode ter caráter lucrativo ou comercial.

         Em Portugal, há uma lei que dispõe especificamente sobre a maternidade de substituição: a Lei nº 32/2006, de 26 de julho, que traz determinações acerca da procriação medicamente assistida. Seu artigo 8º preceitua que

1 – São nulos os negócios jurídicos, gratuitos ou onerosos, de maternidade de substituição. 2 – Entende-se por “maternidade de substituição” qualquer situação em que a mulher se disponha a suportar uma gravidez por conta de outrem e a entregar a criança após o parto, renunciando aos poderes e deveres próprios da maternidade. 3 – A mulher que suportar uma gravidez de substituição de outrem é havida, para todos os efeitos legais, como a mãe da criança que vier a nascer (PORTUGAL, 2006).

      A mesma lei, em seu artigo 39, traz determinações acerca da punição para aqueles que desrespeitarem o disposto no artigo outrora citado, quais sejam:

1 – Quem concretizar contratos de maternidade de substituição a título oneroso é punido com pena de prisão até 2 anos ou pena de multa até 240 dias. 2 – Quem promover, por qualquer meio, designadamente através de convite directo ou por interposta pessoa, ou de anúncio público, a maternidade de substituição a título oneroso é punido com pena de prisão até 2 anos ou pena de multa até 240 dias (PORTUGAL, 2006).

      Pode-se depreender, diante do exposto acima, que a maternidade de substituição em Portugal é considerada uma prática ilegal, pois constitui crime com pena fixada em lei, tanto de prisão quanto de multa.

       Vale destacar, que o Parlamento Português já aprovou alterações à maternidade de substituição, ainda não vigoram, pois o Presidente da República terá ainda que promulgar ou vetar a lei. Trata-se do Projeto de Lei n˚ 183/XIII/1˚, que regula o acesso à gestação de substituição nos casos de ausência de útero, de lesão ou de doença deste órgão que impeça de forma absoluta e definitiva a gravidez, procedendo à segunda alteração à Lei n˚ 32/2006, de 26 de julho, alterada pela Lei n˚ 59/2007, de 4 de setembro. Para exemplificar bem o tema, o artigo 8˚ do referido projeto traz:

“1- Entende-se por gestação de substituição qualquer situação em que  a mulher se disponha a suportar uma gravidez por conta de outrem e a entregar a criança após o parto, renunciando aos poderes e deveres próprios da maternidade.” [...]

“3- A gestação de substituição só poder ser autorizada através de uma técnica de procriação medicamente assistida com recurso aos gametas de, pelo menos, um dos respectivos beneficiários e em caso algum a gestante de substituição poderá ser a doadora de qualquer ovócito  ...”

         Países europeus e americanos existem, ainda, em que a doação de útero pode ser utilizada com ressalvas, como Inglaterra, Grécia e Canadá. Neste sentido, tem-se que o Reino Unido proíbe a gestação por outrem na modalidade onerosa, mas a admite na modalidade gratuita, desde que o consentimento da gestante se aperfeiçoe seis semanas após o parto. Canadá e Grécia adotam regras semelhantes, condicionando a contratação à gratuidade e ao consentimento qualificado que, no Canadá, pode ser aperfeiçoado somente após os vinte e um anos de idade da gestante e, na Grécia, mediante autorização judicial (OTERO, 2010).

      Ainda, há países, como Portugal, que vedam toda e qualquer prática que envolva a maternidade de substituição. Um exemplo é a Alemanha, que na Lei de Proteção aos Embriões, “tipifica como crime a conduta daquele que proceder à fecundação artificial em mulher que esteja disposta a ceder definitivamente o seu filho a terceiros após o nascimento, podendo a pena ser desde multa até prisão por três

     No Brasil, a filiação não é determinada pelo parto. Conforme disposição da Resolução do CFM, deve haver a garantia do registro civil da criança que virá a nascer pelos pais genéticos, devendo a documentação ser providenciada antes mesmo do término da gravidez.

Daniella Campos - Advogada - Especialista em Direito da Medicina pela Universidade de Coimbra - Portugal. 

 
Exclusão do Herdeiro Indigno

       No Código Civil de 2002, o Livro do Direito das Sucessões esta tipificado nos artigos 1.784 a 2.027 e se reveste de fundamental importância, na medida em que entre a vida e a morte se tem todo um complexo de consequências jurídicas. E a morte, como término da existência do homem, se reveste de transcendental relevância porque determina o final de todos os sonhos, expectativas e projetos da pessoa, quer no plano fático, quer no jurídico, além de marcar, contraditoriamente, o início da vida do Direito da Sucessões.

 

      Vida e morte. O mero invocador desse aterrorizante limite, gerador de alegria e horror, sempre despertou na humanidade as mais vivas reações exatamente porque neste cenário irremediavelmente temporal e finito se esgotou a grandeza e a falência do poder humano. E a tão só consideração desta dupla é suficiente para nos fazer compreender a importância do Direito das Sucessões que, em mágica alquimia procura projetar para além da morte a vontade do sujeito de direito, como se fosse possível estender a imortalidade através do patrimônio e da divisão de bens.

 

      Diz o pensamento francês, “le mort saisit le vif” (o morto agarra o vivo). E o Direito das Sucessões se esgota exatamente na ideia singela, mas imantada de significados, de continuidade para além da morte, que se mantém e se projeta na pessoa dos herdeiros. Todos nós somos herdeiros da civilização acumulada por nossos ancestrais, da cultura transmitida pelos que nos antecederam, da educação que nos aperfeiçoa e do patrimônio que passa de pai para filho, na continuidade da natureza humana.

 

       E na qualidade de herdeiros procuramos nos perpetuar dando sequência não só ao material, como poder-se-ia imaginar num primeiro momento, mas no mais profundo desconhecimento da alma, procuramos projetar nossa imagem na continuidade interminável e duradoura dos bens e valores.

 

       A sucessão tem a ver, pois, com o momento qual se opera a transmissão da herança aos legalmente habilitados a ela. Ocorre no exato instante da morte do indivíduo. A transferência da herança ocorre de forma imediata, sem solução de continuidade, pois as relações de direito não podem ficar no mundo jurídico sem titular.

 

       Essa abertura automática da sucessão é fenômeno derivado do “droit de saisine”, que está chancelado em nosso Código Civil através de seu artigo 1.784, que dispõe que aberta a sucessão, a herança transmite-se, desde logo, aos herdeiros legítimos e testamentários. A sucessão legítima é a que se dá em virtude da lei e obedece a uma ordem – ordem de vocação hereditária conforme esta tipificado no artigo 1.829 do Código Civil (descendente, ascendente, cônjuge e colateral) que designa os que serão chamados a suceder, uns na falta dos outros. A sucessão testamentária, como diz o próprio nome, deriva de testamento, isto é, da manifestação de vontade do testador. Aqui é o testador quem determina seus herdeiros.

 

      Um dos elementos constitutivos da essência do direito sucessório é a afeição, que o beneficiado deve nutrir por quem o benéfica, sendo esta também revelada por meio da gratidão ao “de cujus” a determinadas pessoas a quem se destina a herança, seja por força de lei ou por ato de livre vontade. A dignidade da pessoa humana também constitui natureza no direito sucessório, sendo princípio maior da Constituição Federal. 

 

      Duas modalidade podem levar herdeiros a serem excluídos da sucessão: a indignidade e a deserdação. O instituto da indignidade, cerne desse estudo, visa a privação do direito hereditário cominada por lei, a quem cometeu certos atos ofensivos à pessoa ou aos interesses do antecessor. A indignidade não se baseia numa razão objetiva, mas numa circunstância eminentemente subjetiva, traduzida numa atitude de repúdio a lei pelos fatos graves cometidos pelo herdeiro contra o autor da herança.

 

       O artigo 1.814 do Código Civil enumera os três casos de indignidade: autoria ou co-autoria em homicídio doloso, ou tentativa contra o autor da herança e membros da família; acusação caluniosa ou crimes contra a honra em juízo contra a pessoa de cuja sucessão se tratar; emprego de violência ou meios fraudulentos que inibirem ou obstarem o autor da herança de dispor livremente de seus bens.

 

       No primeiro caso temos a mais grave de todas as causas: o homicídio doloso (tentando ou consumado) contra a pessoa do de cujus. Nesse sentido, os provérbios colhidos no direito alemão traz: “blutige hand nimmt kein erbe” (mão ensanguentada não apanha herança) e a recolhida pelos redatores do Código Civil Francês: “n’ hérite pas de ceux qu’ on assassine” (não se herda daquele que se assassina).

 

    No segundo o dispositivo trata de calúnia ou crime contra a honra, reportando-se a Parte Especial do Código Penal que traz: calúnia, injúria e difamação. Nesse caso não tem importância a modalidade ou a forma da queixa ou denúncia, basta ficar provado que o beneficiado levou o falso delito ao conhecimento das autoridades judiciárias, dolosamente, com o objetivo de provocar uma ação contra o inocente, para ser atingido pela indignidade.

 

      Por fim, o inciso terceiro, o legislador se referiu aos atos inibitórios que interferem na livre manifestação de vontade do autor da herança. A liberdade é o fundamento da disposição do patrimônio causa mortis e, por isso, a lei pune o que impede essa autonomia, já dissera Bevilacqua: “a lei quer defender a liberdade de disposição dos bens ao indivíduo por isso pune, com a exclusão da herança.”

 

       Não basta a prática de um dos atos que motivam a exclusão da sucessão por indignidade para o herdeiro ser excluído da sucessão, pois esta não é automática e depende de reconhecimento da causa de indignidade em sentença proferida em ação própria, ou seja, sentença proferida em processo civil.Essa ação esta tipificada no artigo 1.815 do Código Civil. Com a eficácia sentencial o indigno deixa de ser herdeiro, ex tunc: foi, porém não é mais.

 

     Desse modo, vale novamente ressaltar que mesmo quando houver sido proferida prévia sentença penal condenatória ou mesmo uma sentença de natureza cível reconhecendo o comportamento ilícito por parte do sucessor, mostra-se ainda assim indispensável à propositura da ação de indignidade.

 

      Ocorre que há parte da doutrina que entende, de forma segura, que não deveria haver a necessidade de propositura da mencionada ação declaratória. E esse é o melhor entendimento sobre a questão tratada nessa monografia de conclusão de curso. Asseveram que bastaria a sentença penal condenatória, transitada em julgado, reconhecendo o crime cometido pelo filho em detrimento do genitor, ou qualquer outra situação prevista no art. 1.814, para que ocorra a exclusão do herdeiro indigno.Exige-se uma postura ativa de qualquer dos outros herdeiros do falecido, ou seja, depende que quaisquer um dos outros herdeiros ingressem com a ação.

 

      Esse fato só faz com que haja o prolongamento da situação de horror causada pelo autor do crime perpetrada em detrimento do autor da herança, causando-lhe intermináveis lembranças sobre a situação criminal.Coloca frente a frente um herdeiro contra o outro, haja vista que o legitimado passivo para a demanda declaratória será o herdeiro indigno. Imagine só você ficar frente a frente com a pessoa que matou os seus pais e tudo por causa de uma legislação retrógrada que é incapaz de tornar a exclusão automática.

 

       É justo com os outros herdeiros dividir a herança, por exemplo, com um irmão que ceifou a vida de seus pais?Não. Porque é uma injustiça conferir direitos aqueles que não fazem jus a herança deixada, como é o caso de Suzane Louise Von Richthofen que, para impedir sua exclusão da sucessão por indignidade, alegou que agiu em estado de necessidade sendo coagida pelo namorado a cometer uma atitude violenta contra seus pais, por não ter outra forma de ficar com ele. Injustiça é conceder direitos hereditários a aquele que atentou ou consumou contra a vida dos genitores.

 

       A atitude do herdeiro tipificada no artigo 1.814 do Código Civil é inadmissível e totalmente repudiado pela legislação. Os valores da família, do respeito aos mais velhos e aos pais estão se transformando, o direito à vida e à honra estão sendo violado como algo sem relevância. Cada vez mais vemos na mídia as causas de indignidade sendo praticadas por filhos, objetivando a herança de seus pais e infelizmente muito deles não tem a punição que merece e com a possibilidade de ainda receberam a herança.

 

Daniella Campos B. de Amorim

43.202 OAB/GO

 

Pessoa Jurídica pode ser vítima de crime contra a honra ? 

          O Código Penal Brasileiro tipifica delitos que ofendem a honra pessoal, os quais são eles: calúnia, injúria e difamação. A honra é também protegida pela Constituição Federal em seu artigo 5º, inciso X. A honra tem aspecto objetivo e subjetivo. A honra objetiva é a reputação do ser humano, aquilo que os outros pensam sobre o cidadão em relação a seus atributos físicos e morais. Já a honra subjetiva, é aquilo que cada um pensa a respeito de si mesmo em relação a tais atributos.

 

          Considerando que não só uma pessoa física possui uma imagem que pode ser denegrida, mas como também a imagem de uma pessoa jurídica, surge a indagação de uma empresa figurar no polo passivo de um crime contra a honra.O tema é bastante controverso entre juristas e doutrinadores.

 

         Além disso, a Constituição permite sanções penais cabíveis para a chamada criminalidade econômica . Há também a responsabilização criminal de pessoa jurídica por crimes contra o meio ambiente, reconhecida pela Lei dos Crimes Ambientais ( lei 9605 de  1998). O que pode gerar uma discussão sobre uma pessoa cometer o crime de calúnia contra uma empresa. Já que calúnia é imputar falsamente ato criminoso à alguém.

 

         O termo Pessoa” no Direito, é o ente físico ou coletivo suscetível de direitos e obrigações, é o sujeito de direitos. De acordo com o artigo 1º do Código Civil brasileiro, toda pessoa é capaz de direitos e deveres. Porém, não só o ser humano individual é sujeito de direitos, mas também, um agrupamento de pessoas com uma mesma finalidade, como exemplos uma entidade ou uma empresa.

 

           Em se tratando de responsabilidade civil, quando a pessoa jurídica celebra negócio jurídico lícito, através de seus representantes legais, deve-se cumprir o que foi acordado, sob pena de responsabilidade patrimonial por perdas e danos.A responsabilização desses representantes ou administradores pelas obrigações sociais representa relevante avanço na norma civil. Embora a pessoa jurídica não cometa crimes previstos no Código Penal brasileiro, há a previsão legal de delitos ambientais, cometidos por pessoas jurídicas, por decisão de seus representantes legais. A responsabilidade das pessoas jurídicas não exime seus representantes legais da responsabilidade.

 

         O objetivo da Constituição Federal é trazer efetividade e utilidade ao direito criminal ambiental, bem como para do direito penal ambiental. A Lei 9605 de 1998, ainda tipifica condutas lesivas ao meio ambiente e impõe penas e multas, restritivas de direitos ou de prestação de serviços á comunidade.

 

     A referida Lei 9605 de 1998  também tipifica a responsabilidade administrativa ambiental quando forem cometidas infrações às normas ambientais, quando por exemplo, uma autoridade ambiental que tiver conhecimento de infração ambiental é obrigada a promover a sua apuração imediata, mediante processo administrativo próprio, sob pena de co-responsabilidade. Ou ainda toda ação ou omissão que viole as regras jurídicas de uso, gozo, promoção, proteção e recuperação do meio ambiente.

 

          Há que se falar que em  relação aos demais crimes praticados pela pessoa jurídica, a Constituição Federal não foi explícita, mas permitiu que a legislação infraconstitucional estipulasse sanções penais cabíveis para a chamada criminalidade econômica.

 

         Lembre-se que de acordo com Stolze e Pamplona (2011), um mesmo fato pode ocasionar duas responsabilidades, não havendo o bis in idem, justamente pelo fato de cada uma repercurtir da violação do bem jurídico tutelado. As responsabilidades decorrem primeiramente de um fato juridicamente qualificado como ilícito. Todas as responsabilidades constituem uma violação da ordem jurídica, enquanto o ilícito penal acarreta uma violação da ordem jurídica, a única sanção adequada é a imposição de pena, já no ilícito civil as sanções civis são suficientes, como por exemplo as indenizações.

 

     Antes da Constituição, uma empresa sequer poderia ser processada penalmente. Porém com tantos danos ao meio ambiente provocadas pelas empresas como poluição do ar, solo, águas, surgiu a necessidade da aplicação do direito penal para que se visse um resultado positivo para coibir tantas agressões.

 

       A tutela do direito Penal busca, a conservação da vida humana, não permitindo que o homem destrua, causando danos à vida, à sociedade, ao patrimônio, prejudicando toda a coletividade. Busca proteger não só o homem, como também os animais. Entendo assim,   que a pessoa jurídica somente pode ser vítima de calúnia, quando o fato falso a ela atribuído for previsto como crime ambiental. Apesar de a Constituição Federal prever a prática de crimes contra a economia popular, ordem econômica e financeira não há que se falar em crime de calúnia neste caso, já que a responsabilidade penal é individual.

 

           E difamação?pode uma empresa ser vítima? Quanto a difamação, admite-se que a pessoa jurídica seja vítima, já que dispõe de um conceito de valores diante da sociedade. Uma empresa pode ter sua reputação destruída ao ser denegrida por algum fato dito ou exposto de outra forma. Há certa concordância neste caso entre doutrinadores e juristas. Hoje é possível encontrar no Brasil como em outros países, ranking das empresas com melhor reputação no mercado, além de revistas especializadas em divulgar a imagem dessas empresas.

 

           Já em relação a injúria, seria impossível admitir a pessoa jurídica como vítima de tal crime. A injúria fere o íntimo do ser natural. Ela agride a honra subjetiva, ou seja, o sentimento de auto-estima. A honra subjetiva é o julgamento que o indivíduo faz de si mesmo. E ainda há o fator consumativo, no qual este crime se difere dos demais crimes contra honra. No caso da difamação e calúnia o momento consumativo se dá, quando terceiros tomam conhecimento da ofensa, e na injúria quando a vítima toma conhecimento. Sendo assim, não faz sentido dizer que pessoa jurídica possa ser vítima de injúria por não possuir consciência como o ser humano.

 

Tatiana Nolasco,

Advogada Criminalista.

 

Referência bibliográfica:

-STOLZE, Plablo; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo Curso de Direito Civil. Responsabilidade Civil. 9ª edição.2011. vol.III. Editora Saraiva.  

 

Diferenças do furto mediante fraude e estelionato.

 

     Os crimes de furto mediante fraude e estelionato estão previstos no Código Penal dos crimes contra o patrimônio e são facilmente confundidos na hora da tipificação.

 

         O furto mediante fraude está previsto no artigo 155, § 4º, II do Código Penal no qual a pena é maior que a do furto simples, ou seja , é um furto qualificado.

 

         Segundo Mirabete a fraude é meio enganoso, o embuste, o ardil, o artifício empregado pelo agente para subtrair a coisa alheia por exemplo alguém que se apresenta em uma festa como convidado apenas para furtar objetos da 

casa. Lembre que no furto a vítima nunca percebe que está sendo furtada, o 

agente age sem que ela veja. 

 

         O estelionato, o famoso 171, pois está tipificado em artigo com mesmo número, diz: “obter para si ou para outrem, vantagem ilícita, em prejuízo alheio, 

induzindo ou mantendo alguém em erro, mediante artifício, ardil, ou qualquer 

outro meio fraudulento.”

 

        O estelionato deriva de stellio, lagarto que muda de cores iludindo os insetos de que se alimenta. E é exatamente isso que um estelionatário faz, ele cria situações fantasiosas para que a vítima acredite em sua trapaça e acabe 

entregando o bem ou lhe dando alguma vantagem.

 

      Ainda segundo Mirabete as condutas realizadas no estelionato são condutas praticadas pelo homem civilizado que se aproveita das relações complexas da vida moderna para enganar o próximo utilizando a malícia humana.

 

       Um exemplo clássico é uma pessoa que se passa por manobrista de estacionamento, pois quer que a vítima lhe entregue as chaves de livre espontânea vontade acreditando que o agente irá apenas estacionar o carro 

quando na verdade este estará se apropriando do carro para uso próprio.

 

             Conclusão: no furto há discordância da vítima ou seja a tirada do objeto ocorre contra a vontade da vítima, já no estelionato a entrega é feita livremente pela vítima que foi induzida ao erro, há concordância da vítima. Resumindo: no furto ‘’se tira’’ e no estelionato “se engana”. 

 

Tatiana Nolasco

Criminalista       

 

Referência Bibliográfica: FABRINI, Renato N.; MIRABETE, Julio Fabrini; Manual de Direito Penal vol. II, Parte Especial; 26ªed; 2009; São Paulo;Ed.Atlas)

 

 
O poder de tributar e o Princípio da Vedação ao Confisco.

           O Princípio da Vedação ao Confisco deriva do Princípio da Capacidade Contributiva, atuando aquele em conjunto com este, porquanto essa capacidade econômica se traduz na aptidão para suportar a carga tributária sem que haja perecimento da riqueza tributável que a lastreia, calcada no mínimo existencial. A propósito o mínimo existencial (vital ou necessário) esta delineado no artigo 7˚, inciso IV, da Constituição Federal, cujo teor indica os parâmetros de quantidade de riqueza mínima, suficiente para a manutenção do individuo e sua família.

 

          A doutrina tem se limitado a afirmar que será confiscatório o tributo que exceder a capacidade contributiva sem, todavia, ofertar critérios objetivos para a sua verificação.

 

       O Supremo Tribunal Federal sumulou entendimento que é inadmissível apreensão de mercadorias como meio coercitivo para pagamento de tributos e inaceitável a interdição de estabelecimento como meio coercitivo para cobrança de tributos. Não é lícito à autoridade proibir que o contribuinte em débito adquira estampilhas, despache mercadorias na alfândega e exerça suas atividades profissionais.

 

         No momento em que a tributação subtrai do contribuinte a capacidade de se sustentar e se desenvolver, afetando a garantia de atendimento às suas necessidades essenciais, tem-se o confisco.

 

         O que se objetiva é evitar que por meio do tributo, o Estado anule a riqueza privada. O poder de tributar envolve também o de conservar. Cabe ao Poder Judiciário dizer os limites da confiscatoriedade. É de enaltecer que não há, no Brasil, parâmetros objetivos, com moldes cartesianos preestabelecidos, delimitadores do que vem a ser uma tributação tradutora de confiscatoriedade.

 

           Vale lembrar que tanto a multa moratória quanto a multa punitiva podem ser confiscatórias se extrapolarem os lindes do adequado, do proporcional, do razoável e do necessário, colocando em xeque as suas precípuas finalidades, com a ofensa do artigo 150˚, inciso IV c/c artigo 5˚, inciso XXII, ambos da Constituição Federal.

 

         Multa moratória é diferente de multa punitiva. Na multa moratória – é a multa que se paga pelo mero inadimplemento. Já a multa punitiva – é a multa decorrente da tentativa de sonegação fiscal. A todas elas se aplicam o Princípio da Vedação ao Confisco.

 

         Tem-se ainda o efeito do confisco nas taxas, que será aferido a partir da falta de correspondência entre o valor tributável exigido e o custo da atividade estatal, levando-se em conta que este traduz em base de cálculo das taxas, nítidos gravames bilaterais.

 

         Por fim, é visível o recrudescimento indiscriminado da carga tributária no Brasil. Dia a dia, emanam dispositivos que aumentam ou instituem tributos, ornamentando o indigesto “bolo” da tributação brasileira.

 

           A carga tributária, analisada global ou individualmente, deve rimar com as limitações constitucionais ao poder de tributar, a saber, os princípios tributários. Dentre aqueles de expressivo cunho subjetivo, destacando-se o postulado que veda a confiscabilidade tributária.

 

 

Daniella Campos B. De Amorim

Advogada Tributarista 

            Da fecundação in vitro resultam necessariamente embriões. Estes tanto podem ser introduzidos imediatamente no corpo da mulher como podem ser conservados por congelação. Mais: para que se obtenha uma gravidez bem sucedida através deste método, é necessário uma grande estimulação da ovulação e, depois, nem todos os embriões fecundados são implantados, além do mais, com o louvável intuito de obter um número de embriões suficientes para garantir o sucesso da tentativa (consideradas as perdas que estatisticamente se conhecem) pode acontecer que se produzam um número excessivo de embriões, discutindo-se o destino dos “embriões excedentes”.

  

          O primeiro problema com relevância jurídica é o da legitimidade para decidir o que quer que seja. O direito de decidir cabe aos progenitores, ou ao doador quando ele existe, ou aos médicos, embora os poderes oficiais também possam estabelecer limites ? A solução desse problema, deveria estar atrelada a dimensão pública e a dimensão privada da decisão: a legitimidade caberia não só aos progenitores mas também aos médicos, dentro dos limites estabelecidos pela lei ou por outras regras de conduta geralmente estabelecidas.

           A eventual destruição dos embriões excedentes pode vir a ser considerada uma violação do direito à vida, desde que se entenda que a tutela constitucional abrange os embriões desde o primeiro momento da fecundação e que a norma é absoluta sem exceção. Há doutrinadores que não tem essa concepção, dessa maneira se o mesmo não fosse tutela pelo direito a vida, então seria pelo direito das coisas ?

            Na esfera penal portuguesa não é considerada atitude criminosa a atitude de destruição dos embriões, não se encontra previsto qualquer tipo legal de crime contra a vida embrionária e extra-uterina; o que resulta em contraste, em relação ao Brasil que há o atentado contra a vida intra-uterina – o crime de aborto.

              No Brasil, existe a Resolução n˚ 1.358/92 que prevê a possibilidade de doação, não havendo menção expressa à proibição ética de descarte ou destruição e silêncio sobre a utilização para pesquisa, mas, tendo em vista a possibilidade legal das outras soluções, essas hipóteses deverão ser comunicadas aos pacientes e eles deverão manifestar o que pretendem, ainda que eventualmente o desejo expresso não venha  a ser atendido.

         Em Portugal a Lei n˚ 32/06 parte de uma proibição e de uma recomendação, a proibição é a de produzir embriões com destino à investigação científica (artigo 9/1), já a recomendação é a de a produção de embriões para transferência ser limitada ao número necessário para o êxito do processo (artigo 24/1).

Daniella Campos - Advogada - Especialista em Direito da Medicina pela Universidade de Coimbra - Portugal. 

O Direito a Genética e o anonimato dos envolvidos 

            O filho nascido com a intervenção de um doador terá a possibilidade de descobrir quem é o seu progenitor ? Ou ainda o doador do material genético poderá conhecer o fruto de tal concepção ?

            O anonimato das partes é garantido com o fim precípuo de se manter a distância entre os envolvidos, uma vez que aquele que doa não quer qualquer envolvimento com o receptor, sobretudo considerando-se a inexistência de qualquer vínculo de parentesco entre este o fruto da concepção, bem como, por outro lado, o receptor do material precisa de tal sigilo a fim de se estabilizar a unidade familiar a que pertence e está em construção.

            Um dos motivos que pode ensejar a busca do doador pelo fruto da doação é o exercício do direito ao conhecimento da ascendência biológica, eis o que diz a ilustre doutrinadora Maria Helena Diniz [1]:

            “... a história da saúde de seus parentes consanguíneos para fins de                    prevenção de alguma moléstia física ou mental ou de evitar incesto (...)

 

            Para João Loreiro, é um direito à identidade genética como o direito de cada ser humano ter um genoma próprio, salvaguardando, biologicamente, sua constituição genética individual; um direito a não repetição desse patrimônio genético, tornando-se inviolável, vedando-se a clonagem humana e um direito à identidade genética como direito ao conhecimento dos genitores, à historicidade pessoal ou à ascendência a matre e patre biologicamente verdadeira.”

             Além do mais, o diagnóstico e a terapêutica de doenças hereditárias reclamam cada vez mais a análise e a conservação daquelas informações sobre o genoma humano, e a satisfação desta existência é independente daquela outra opção fundamental.

             Pode se dizer que o direito ao conhecimento à ascendência biológica, por ser tão ínsito ao próprio ser, tange à dignidade da pessoa humana, direito este previsto constitucionalmente, sendo, pois, inclusive, cláusula pétrea na Constituição da República Federativa do Brasil, vedada sua supressão. Ocorre que ao possibilitar a quebra do compromisso do anonimato, estar-se ia exterminando a segurança familiar, jurídica e a paz social.

            No Brasil a solução ao questionamento proposto atualmente está longe de encontrar uma reposta unânime. Atualmente positivado só existe a Resolução 2.013 do CFM que regulamente essa matéria no inciso IV, dispondo que:

             IV- Doação de gametas ou embriões (...)

             2- Os doadores não devem conhecer a identidade dos receptores e vice-              versa. 3- (...) 4- Obrigatoriamente será mantido o sigilo sobre a                          identidade dos   doadores de gametas e embriões, bem como dos                      receptores. Em  situações especiais, as informações sobre doadores, por              motivação médica, podem ser fornecidas exclusivamente para médicos,                resguardando-se a identidade civil do doador.

             Contudo, cumpre ressaltar que há projeto de lei brasileira (Projeto de Lei n˚ 1.184/03) que, apesar de ter optado também pelo anonimato como regra, prevê, em caráter excepcional o acesso às informações genéticas do doador, inclusive sua identidade civil, em seu artigo 48.

             Em Portugal, o filho por inseminação artificial pode, “junto dos competentes serviços de saúde, obter as informações de natureza genética que lhe respeitem, mas não podem conhecer a identidade do doador (Lei n˚ 32/2006, artigo 15/2). Pode-se ainda obter informação sobre eventual impedimento legal para casamento junto do Conselho Nacional de Procriação Medicamente Assistida, mas a identidade do doador só poderá ser revelada se este expressamente o permitir (Lei n˚ 32/2006, artigo 15/3).

             Mas o artigo 15 da Lei n˚ 32/2006 contém um número 4, que estabelece: “Sem prejuízo do disposto nos números anteriores, podem ainda ser obtidas informações sobre a identidade do doador por razões ponderosas reconhecidas por sentença judicial.”

              Em relação a um direito comparado, cada país adotou um posicionamento com relação a esse assunto, formando, assim, duas correntes bem definidas e diametralmente opostas, quais sejam a de que preserva o anonimato e a que permite o conhecimento dos envolvidos, sendo que, neste caso, há uma subdivisão quanto ao reconhecimento do vínculo parental ou não.

               A título exemplificativo, de um lado tem-se a França e a Dinamarca, que vedam de forma absoluta a quebra do anonimato. De outro, tem-se a Espanha e o Uruguai possuindo leis permitindo o conhecimento pelo fruto da concepção do doador do material genético, quando a questão envolve risco à saúde do fruto da concepção, e a Áustria e a Inglaterra, independente do motivo ensejador, havendo, ainda, projeto de lei argentino neste mesmo sentido.

                Por fim, não é nada fácil optar entre estas duas grandes tendências. Qualquer delas se apoia na defesa de valores ponderosos, respectivamente, na defesa da paz da família e na defesa da verdade acerca da ascendência biológica.

 

                O anonimato do doador parece exprimir bem a irrelevância da sua identidade e do seu papel social no processo de fecundação, porém, a ocultação da verdade biológica parece contrariar não só a relevância em geral, dos conhecimentos das ciências biológicas, mas também o culto da verdade nas sociedades em que o problema da inseminação heteróloga se põe.

 

[1] DINIZ, Maria Helena. O estado atual do biodireito. São Paulo; Saraiva, 2010, p.58

Daniella Campos - Advogada - Especialista em Direito da Medicina pela Universidade de Coimbra - Portugal. 

 

As Diferenças entre Organização Criminosa e Associação Criminosa

 

           O crime organizado está disposto na Lei 12 850 de 2013, é fato que a Lei 9034 de 1995 tratava de métodos de combate a este crime e trazia meios extraordinários de investigações das organizações criminosas. Mas a antiga lei nunca definiu tal crime.

 

        A Lei 12 850/13 surgiu para preencher esta lacuna que muitas vezes era  suprida pela definição dada pela Convenção de Palermo. Assim define a nova lei sobre a organização criminosa:

 

      “Considera-se organização criminosa a associação de 4 ou mais pessoas estruturalmente ordenada e caracterizada pela divisão de tarefas, ainda que informalmente, como objetivo  de obter, direta ou indiretamente, vantagem de qualquer natureza, mediante a prática de infrações penais cujas penas máximas sejam superiores a 4 anos, ou que sejam de caráter transacional.”  

 

        A ideia de organização pressupõe uma coletividade ou reunião de esforços de agentes distintos, do ponto de vista da estrutura do tipo penal. Assim, deve-se ter o concurso necessário, ou seja, pluralidade de agentes.

 

        Na organização criminosa há uma hierarquia de funções, onde cada agente criminoso desempenha uma tarefa com habitualidade e permanência com a finalidade de obter qualquer tipo de vantagem.

 

       A nova Lei que dispõe sobre a Organização Criminosa revogou o termo “quadrilha ou bando”, previsto no artigo 288 do Código Penal. O termo correto e atualizado é Associação Criminosa.

 

          Sendo assim, Associação Criminosa é a união de 3 ou mais pessoas para o fim específico de cometer crimes. Além disso a condenação é aplicada a penas máximas inferiores a 4 anos.

 

          Mas tanto a Organização Criminosa e a Associação Criminosa possuem um ponto em comum: precisam de um liame subjetivo e psicológico, ou seja, a vontade e intenção do agente para se unir aos demais para praticar crimes.

 

Tatiana Nolasco/ Criminalista

 
A rapidez da cobrança das taxas de condomínio no novo CPC.

       O desenvolvimento dos grandes centros e a verticalização das cidades propiciam o crescimento ostensivo do número de condomínios. Este fenômeno pode ser observado não somente nas grandes metrópoles, mas também nos pequenos munícipios.

 

         Deste crescimento, derivam todos os problemas atinentes à administração condominial: inadimplência, sistemática de cobranças das cotas condominiais e muitos outros.

 

        A inadimplência é um fator preocupante para os administradores, sendo certo que para a sua sobrevivência, o condomínio necessita de recursos, obtidos por meio da cobrança das taxas de condomínios.

Ao primeiro índice da inadimplência, a administração de condomínio deve prontamente tomar as providências cabíveis para agilizar o procedimento de cobrança.

 

       É bem verdade que o dever de pagar findou à mercê, na prática, do cumprimento quase que voluntário pelo condômino.

 

        A multa pelo inadimplemento é ínfima (2%!) e não assusta devedor algum, por igual, a admissão do exercício, pelo inadimplente, de todos os direitos do condômino (inclusive, mas não somente, o uso de áreas de lazer), por certo não há de estimular o devedor a pagar. De resto, nem se cogite de cobrança vexatória, cuja única repercussão econômica será em desfavor do condomínio, quando condenado a indenizar.

 

           Mas, como cobrar ? O que fazer ?

 

       É indiscutível que a melhor solução será sempre a negociada, notadamente diante da urgência que torna os valores tão prementes ao Condomínio. Porém, às vezes, negociar não é possível. Resta então a saída de ir aos tribunais, empreitada tormentosa para os Condomínios, vale dizer, a cada um dos condôminos adimplentes.

 

      A quantidade de processo no judiciário fazem com que as cobranças judiciais se avolumam, mas este não é o maior problema: é a necessidade de um processo de conhecimento que é moroso e desgastante para que receba seu crédito.

 

         Com a entrada em vigor do novo CPC (Lei 13.105 de março de 2015), que ocorrerá no próximo ano, um dos maiores avanços, no ramo do Direito Imobiliário, foi a mudança na forma de cobrança judicial de contribuições condominiais.

 

     As cotas condominiais passarão a ter natureza de título executivo extrajudicial, o que torna a sua cobrança pela via judicial muito mais rápida.

 

      Tendo o título força executiva extrajudicial, a sua cobrança pela via judicial é feita em menos tempo do que se ele não tivesse este status, posto que não é necessário o ajuizamento de uma ação ordinária, onde há a fase de conhecimento, podendo, o credor, ingressar diretamente com a ação de execução para perseguir seu crédito. Na execução de título executivo extrajudicial, o devedor é citado já para efetuar, dentro do prazo de três dias, o pagamento da dívida, sob pena de constrição patrimonial, regra esta que foi mantida pelo Novo CPC.

 

           O  acerto legislativo ao elencar as taxas e despesas condominiais no rol dos títulos executivos extrajudiciais — artigo 783, inciso VIII da Lei 13.105/2015 — se dá em razão de que o título executivo extrajudicial, expressando obrigação certa, líquida e exigível, é composto pelo conjunto da convenção de condomínio. Desta, se extrai o critério de divisão das despesas dentre as unidades autônomas condominiais — da ata de assembleia aprovando o orçamento, da discriminação do débito, bem como da data prevista para o seu vencimento. Já a sujeição passiva na execução decorreria do artigo 1.336 do Código Civil, que impõe ao condômino o dever de “contribuir para as despesas do condomínio na proporção das suas frações ideais, salvo disposição em contrário na convenção”. Assim, não há necessidade de um processo de conhecimento para declarar que o título é exequível, quando ele já contém todos os requisitos de existência de um título executivo, faltando apenas que a lei outorgue tal status.

 

          A outra mudança é o artigo 517 que inova com a possibilidade de protesto, não da taxa do condomínio (outra questão a ser debatida), mas da decisão judicial transitada em julgado que poderá ser levada a protesto, nos termos da lei, depois de transcorrido o prazo para pagamento voluntário previsto no art. 523 do NCPC.

 

           O próximo ano tem muito à beneficiar os Condomínios, com a sua rápida recomposição da economia e, de outro, evitar a constrangedora convivência com inadimplentes que gozam do condomínio à custa dos bons pagadores.

 

Daniella Campos B. de Amorim

43.202 OAB/GO

 

 
Adoção por casais homoafetivos. 

       

O objeto deste artigo é tratar sobre a adoção realizada por casais homoafetivos sob o aspecto jurídico e legal.

 

 Nos dias atuais, podemos dizer que temos um conceito de família mais amplo, ou seja, não se considera mais família apenas aquele conjunto de pessoas que possuem grau de parentesco entre si e formam um lar. A Constituição brasileira legitimou e reconheceu outras formas de organização familiar, provocando assim, um novo conceito de família, o qual é baseado, principalmente, no vínculo afetivo. Assim, pode-se dizer que a família passou a ser analisada sob o prisma do afeto, entre pessoas unidas com um objetivo comum. Consequentemente, ao lado da família tradicional, foram reconhecidas constitucionalmente as uniões estáveis e as famílias monoparentais, formadas por qualquer um dos pais e seus descendentes.

 

Embora o constituinte de 1988 não tenha trazido expressamente a possibilidade de adoção por casais homoafetivos não quer dizer que a Constituição proíba tal situação, pois caso o fizesse, o teria trazido em seu corpo de forma expressa. Ou seja, não há que se discutir a constitucionalidade de tal instituto. A união estável homoafetiva já foi declarada constitucional em 2011 pelo STF e sendo a adoção um instituto o qual decorre muitas vezes daquela, logo se presume pela constitucionalidade deste.

 

Ademais, o Estatuto da Criança e do Adolescente, em seu artigo 42 leciona que podem adotar as pessoas as quais já atingiram a maioridade civil, independentemente do estado civil, sendo omisso em relação à orientação sexual do adotante. Logo, nesse ponto de vista, não há que se questionar a orientação sexual do adotante, importando apenas se o casal possui condições financeiras e psíquicas de receber um ser humano em seu lar para receber afeto e carinho, independentemente se é hetero ou homoafetivo.

 

Por outro lado, ainda permanece a resistência da concessão da adoção a um casal homoafetivo, com justificativas preconceituosas e desfundamentadas, como a de que a criança poderia enfrentar problemas em seu ambiente escolar, ausência de referenciais de ambos os sexos para seu desenvolvimento, obstáculos na Lei dos Registros Públicos, e de que aquela sofreria influência na sua orientação sexual, vindo a optar pelo homossexualismo devido à ausência de modelo do gênero masculino e feminino podendo eventualmente tornar confusa a própria identidade sexual.

 

Muitas vezes, um pedido de adoção por um casal homoafetivo, ao chegar no Poder Judiciário, se confronta com a ideologia conservadora do juiz, que hesita em identificar a melhor solução, deixando de atentar no prevalente interesse do menor. Posturas pessoais ou convicções de ordem moral de caráter subjetivo não podem impedir que se reconheça que uma criança, a qual está em um abrigo há anos, terá uma melhor formação se integrada a uma família, seja esta formada por pessoas de sexos iguais ou distintos.

 

É preciso tirar o preconceito de que somente os homoafetivos possuem condutas que agridam a formação social, moral e psicológica do adotando, devendo o heterossexual ser visto sob o mesmo prisma, sendo ambos investigados de maneira idêntica, deixando de lado o tratamento diferenciado que é dado aos homoafetivos, tendo como fundamento a sua orientação sexual, visto que essa diferenciação vai contra os Princípios Constitucionais da Dignidade da Pessoa Humana e da Isonomia, bem como ao Princípio do Melhor Interesse da Criança.

 

A maioria da doutrina e a jurisprudência demonstra-se segura quanto ao direito de todo o ser humano, sendo pai, mãe, criança ou adolescente, constituir uma família. Logo, torna-se indispensável preencher todos os requisitos legais não sendo privilégio exclusivo de heterossexuais, mas de todo indivíduo, o qual quer constituir uma família.

 

Assim, não há em nosso ordenamento jurídico proibição expressa de que um casal do mesmo sexo tenha o direito de adotar já que a maioria da doutrina e a jurisprudência demonstra-se segura quanto ao direito de todo o ser humano constituir uma família, sendo que, hoje, a filiação socioafetiva se sobrepõe aos vínculos biológicos e legais. Mas é indispensável preencher todos os requisitos legais entendendo-se que tal instituto não é privilégio exclusivo de heterossexuais, mas de todo indivíduo, o qual quer constituir uma estrutura familiar.

 

Igor Gouveia de Fleury

 Advogado.

 

Redução da Maioridade Penal: Solução

     Há mais de 20 anos aguardando um posicionamento do Congresso Nacional, a PEC 171/93, que trata da mudança na maior idade penal, enfim, parece ter deslanchado. Atentos à polêmica, a população e a comunidade jurídica acompanham com cautela a possibilidade da diminuição de 18 (dezoito) para 16 (dezesseis) anos da inimputabilidade criminal.

 

        Observando prós e contras, o fiel da balança parece tender, ao juízo deste que escreve, à manutenção da atual sistemática temporal. Justifico. Penso estarmos diante de um fenômeno jurídico, definido academicamente pelo professor Marcelo Neves, denominado de "Constitucionalização Simbólica", ao qual passo a explicar. A Constitucionalização Simbólica seria um instituto axiologicamente inverso ao aclamado Neoconstitucionalismo, programática que busca trazer efetividade às normas constitucionais. 

 

       Aquela famigerada técnica legislativa seria utilizada para confirmar valores sociais (trazendo uma vitória legislativa à ideologia de um grupo) através de uma legislação álibi (como uma resposta do Estado para acalmar os ânimos da vox populi) postergando a solução de conflitos sem a necessária efetividade que a situação importa. A redução da maior idade penal para dezesseis anos em definitivo, segundo a maioria absoluta dos especialistas em segurança pública, não soluciona a questão da marginalidade infanto-juvenil.

 

       Conforme anotado pelo Ministro Marco Aurélio de Mello, do Supremo Tribunal Federal, em recente entrevista sobre o tema, "cadeia não conserta ninguém". Se em unidades desenvolvidas para a reeducação de jovens, os apreendidos  não conseguem, em sua grande maioria, se ressocializar, o que se dirá em presídios! É jargão que unidades prisionais são verdadeiras "escolas do crime", onde condenados apuram a marginalidade em seus tempos de reclusão.

      

       Sendo assim, facilmente chega-se a conclusão de que a PEC 171/93 não ira solucionar o caso, conforme já adiantado, podendo, inclusive, agravá-la. Trata-se de uma proposta de cunho altamente populista, haja vista que no imaginário parlamentar o "revanchismo" aos adolescentes infratores facilmente cairia nas graças do povo, ansioso por medidas que combatam a impunidade. A alocação, em meu entendimento, do projeto de emenda junto à categoria da legislação simbólica é cristalina. A vitória da redução serviria de bom grado à lealdade das massas, tornar-se-ia um sucedâneo aos desejos populares (legislação álibi) e postergaria a solução definitiva.

 

        Esta fatídica proposta é demasiadamente vazia em si mesma, o que, nos dizeres de nossa gênesis significaria "tapar o sol com a peneira". Os entusiastas da medida alicerçam sua justificativa à suposta necessária equiparação da responsabilidade penal à eleitoral, que hoje permite o voto aos dezesseis anos de maneira facultativa. Esta não me parece a melhor hermenêutica. Entendo que a permissividade incrustada ao sufrágio, em verdade, traduz um incentivo ao jovem à prática cidadã, transformando-o em um agente participativo junto ao meio social, inserindo gradativamente a noção de responsabilidade necessária à vida adulta, tanto que o reveste do caráter facultativo.

 

        O incentivo em questão não deveria ser alocado como consectário lógico à persecutio criminis, que está teologicamente em grau e finalidade diferentes. Em que pese o entendimento da ineficácia embutida na PEC 171/93 ela não parece eivada de inconstitucionalidade. É uníssono o entendimento de que a imputabilidade é uma cláusula pétrea, por tratar-se de direito individual em face à atuação estatal, porém, a jurisprudência do STF- que tem como leading case a taxação dos inativos- vem caminhando no sentido de que as disposições pétreas podem ser reformadas, desde que não haja tendência a abolir o preceito ali estabelecido.

 

        O projeto em análise não irá abolir a inimputabilidade, apenas irá reduzir seu parâmetro definidor, campo de atuação discricionária e legítima dedicada ao parlamento, que terá a liberdade política de decidir pela aprovação ou não da proposta. O que se espera é que o Congresso pretira o populismo em prol de esforços que busquem, efetivamente e de maneira perene, o combate à marginalidade.

 

        Nos dizeres do professor Neves, citado por Lenza, a hipertrofia da função político-simbólica resulta em duas conseqüências: público enganado e políticos sínicos. O futuro dos nossos jovens infratores deve mesclar, sem dúvida, disciplina e EDUCAÇÃO. Qualquer medida em contrário a estes pressupostos levará a uma conta salgada a realidade do país. Você está disposto a pagar este preço? Eu não.

 

Guilherme da Costa Fernandes

OAB/GO N 39.431

 
 
Que País é esse?

            Renato Russo, vocalista da banda Legião Urbana, já nos fazia este questionamento em 1987, ao cantar "ninguém respeita a Constituição, mas todos acreditam no futuro da nação". Enfatizando esta afirmação do músico, o Presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ) acaba de "presentear" o povo brasileiro com uma verdadeira aberração processual ao aprovar, em primeiro turno, a Emenda Constitucional que trata  da redução da maioridade penal de 18 para 16 anos para crimes hediondos, homicídio doloso e lesão corporal seguida de morte.

 

           Nossa Carta Magna de 1988, versa sobre o processo legislativo e mais especificamente sobre a emenda à Constituição no artigo 60. Em seu parágrafo 4º, inciso IV, menciona: "Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir os direitos e garantias individuais", tratando-se de uma cláusula pétrea, ou seja, algo que não se pode alterar na Constituição. No entanto, o Presidente da Câmara dos Deputados ignorou tal premissa e promoveu uma ilegalidade regimental.

 

           Ademais, no parágrafo 5º, enuncia: "A matéria constante de proposta de emenda rejeitada ou havida por prejudicada não pode ser objeto de nova proposta na mesma sessão legislativa", compreendida entre os dias 02 de fevereiro e 22 de dezembro, de cada ano. Exemplo de mais um ato de onipotência do Presidente desta Casa, visto que num tempo recorde conseguiu uma nova votação para a referida matéria. Sendo a Constituição Federal a lei maior de um Estado Democrático de Direito, que rege todo o ordenamento jurídico e suas leis infraconstitucionais, deve ser observada e seguida, indistintamente, por todos, principalmente por aqueles que são  responsáveis pela elaboração de nossa legislação. No entanto, nos deparamos com situações como esta protagonizada pelo Deputado Eduardo Cunha, numa total afronta à jurisdição de nosso país.

 

               Embasados pelos artigos constitucionais supracitados, notamos, ainda, outras inconstitucionalidades da referida Emenda à Constituição, no que tange aos artigos destinados à Criança e ao Adolescente, numa completa violação a alguns princípios, dentre eles o Princípio da Igualdade (os iguais devem ser tratados igualmente e os desiguais desigualmente). Como o artigo 227, parágrafo 3º, inciso V, que estabelece que é dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. O direito à proteção especial abrangerá os seguintes aspectos: obediência aos princípios de brevidade, excepcionalidade e respeito à condição peculiar de pessoa em desenvolvimento, quando da aplicação de qualquer medida privativa da liberdade.

 

           De acordo com este cenário, observamos que nos tempos hodiernos, os jovens são desrespeitados e não tratados como consagrados e amparados pela Constituição Federal, em nossa sociedade, num verdadeiro desserviço ao desenvolvimento humano, como já postulava Pitágoras, entre os séculos VI e V a.C: "Educai as crianças e não será preciso punir os homens". Não sendo o bastante, tamanha violação às normas constitucionais, temos no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) um importante instrumento de proteção, que, se feitas algumas adequações e aplicado corretamente, seria o suficiente para a diminuição da violência e para o desenvolvimento dos jovens.

 

         Mas como nos indaga, Renato Russo: "Ninguém respeita a Constituição, mas todos acreditam no futuro da nação. Que país é esse?"

 

Renato Rassi

Advogado Criminalista

 

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